Até quem não é professor, já pensou em ser um. Na sala de casa, ou mesmo no pátio da escola, qual foi a criança que nunca fingiu ser o mestre e fez o coleguinha de aluno. Admiração por profissionais que têm a responsabilidade de educar um país, mas que ainda não possuem, segundo eles próprios, essa importância reconhecida – especialmente do ponto de vista financeiro.
Por amor à arte de educar, eles buscam, então, funções alternativas para incrementar a renda e continuar em sala de aula.
Facilmente você encontra “professores comerciantes”, “vigilantes”, “empresários”, “artesãos”. Eles desenvolvem uma outra habilidade, uma outra história, como os aposentados Jacinto Lopes, 60 anos, e Fátima Moura, 56.
Durante a semana, eles se dividem para atender aos 22 alunos do reforço escolar – que inclusive é lotado. No mês de outubro, já começam as ‘inscrições’ para o ano letivo seguinte.
No sábado e domingo, os professores se “transformam” em comerciantes, preparam uma feijoada que já é sucesso no bairro dos Bancários, em João Pessoa, onde moram, e atrai cerca de 80 clientes nos dois dias de vendas.
Fátima conta que o casal morava em Recife e, há cerca de 12 anos, resolveu vir morar na Paraíba – foi aí que tudo começou. Sem emprego, colocaram o reforço escolar, que sozinho não era suficiente para conseguir a renda que desejavam. Apostaram na feijoada.
“Eu trouxe essa ideia de Recife, porque lá é comum as pessoas servirem feijoada. Gosto demais das duas profissões”, revela Jacinto, que é quem bota a ‘mão na massa’ e prepara a refeição – cuja receita aprendeu com a mãe. Já Fátima fica responsável por fazer as quentinhas e distribuir com os clientes.
“Parece um Piano”
Na casa, pequena, Jacinto atende aos seus alunos (um por vez) na sala, espaço compartilhado com os caldeirões usados no preparo da feijoada. Nos dias de aulas, as panelas ficam ‘disfarçadas’ em cima de um fogão industrial, que é coberto com um lençol. “Parece um piano”, comenta Fátima, que ensina aos alunos no próprio quarto.
O casal revela, ainda, que é na quinta-feira à noite que começam os preparativos para o fim de semana. Jacinto cata os feijões, tira o sal da carne, é o cozinheiro. Mas mesmo com todo o trabalho ele afirma, alegre, que não é difícil conciliar as duas profissões e que a feijoada já virou lazer.
Orgulhosos, os professores, que ensinam alunos de ensinos fundamental e médio, também recordam que 14 dos seus ex-alunos já estão formados, outros, casados e com filhos. “É muito gratificante. Nossos alunos são como nossos filhos”, reforçam.
restaurante
E assim como Jacinto e Fátima, o professor Ronaldo Cruz usou o olhar para os negócios para incrementar a renda do magistério. Resolveu montar um fiteiro no jardim da casa da tia, depois uma lanchonete, até chegar ao patamar de restaurante – que hoje mantém no Centro de João Pessoa.
“Fui aumentando os negócios e pela capacidade e esforço transformei em um restaurante. Administro o estabelecimento com a ajuda de cinco funcionários”, contou, revelando que há 29 anos ensina física em um colégio público da capital.
Mesmo com tanto tempo de profissão, ele aponta que o salário base fica muito aquém do esperado e é insuficiente para se qualificar e manter a família. A remuneração é de R$ 825,00, por 30 horas de trabalhos semanais. “O inicial é ainda pior – R$ 793,00”, comenta.
Ronaldo ressalta que em meio às dificuldades, que vão além da questão salarial, ele continua firme exercendo o magistério. “Continuo sendo professor porque corre em minhas veias sangue de educador. Gosto muito dessa profissão. Não abandono a luta do magistério pela quantidade de alunos que precisam de educação e também para defender a valorização dos profissionais”.
Ele lembra, ainda, que a falta de material didático para ministrar boas aulas, a violência e o desrespeito por parte de alguns estudantes também fazem parte da rotina dos educadores.
“Mesmo assim, pela vontade de buscar uma educação de qualidade para os nossos alunos é que eu não abandonei a profissão”, reforça.
Paraiba hoje
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